Em Portugal, segundo uma notícia do Público, a Assembleia da República, baluarte do Estado democrático, convidou o presidente do FC Porto para um jantar dentro do espaço do Parlamento.
De acordo com as declarações da deputada socialista Rosa Albernaz trata-se de «um jantar-convívio», de «uma iniciativa que já vem de há muitos anos, já foi feito com o Benfica e com o Sporting».
Quando a deputada diz que «já vem de há muitos anos», presume-se que queira dizer que já tinha acontecido antes de existir na justiça portuguesa o processo de corrupção denominado Apito Dourado. É uma suposição, claro está.«Assim como se convidam autarcas de dirigentes de associações, convidamos também o senhor Pinto da Costa», esmiuçou a deputada socialista, ou seja, do partido que nesta altura do campeonato forma o Governo.
A notícia terminava em beleza: «Pinto da Costa será recebido antes do jantar pelo presidente da Assembleia da República, Jaime Gama.» Ora Jaime Gama nem vai muito em futebóis. Não gosta e está no seu direito. Ou será que já gosta? Também está no seu direito.Pinto da Costa é um dos envolvidos do processo Apito Dourado.
As acusações sobre o presidente do FC Porto são tudo menos lisonjeiras. As transcrições de conversas telefónicas que o envolvem podem não ser válidas para o Ministério Público mas são válidas para a opinião pública, para o mais comum dos cidadãos. Esses mesmos cidadãos, um a um, que elegem os deputados da Assembleia da República. A Assembleia da República é, portanto, um lugar respeitável. Não pode ser um terreiro de comícios contra o curso da justiça, como já foi, infelizmente, por ocasião de um outro processo judicial, o da pedofilia.
«A Federação Portuguesa de Futebol também podia aplicar sanções, como em Itália, aos clubes apanhados nas escutas do Apito Dourado. Não há nada que o proíba, nem sequer que impeça que algumas das matérias já arquivadas no âmbito criminal possam ser sujeitas a sanções desportivas no âmbito disciplinar.
"O que acontece no nosso país é um problema de mentalidades. Todos acham que uma actividade só é ilícita se for penalmente criminalizada", diz ao Público, António Cluny, procurador-geral adjunto.»
Jantarão bem os deputados com o presidente do FC Porto? Ainda haveremos de chegar ao ponto de ouvir dizer que os deputados, com a ironia do costume, votaram a lei tal e tal...
Uma ideia completamente disparatada, atendendo ao país: A pressão do poder político sobre o poder judicial é o maior flagelo das sociedades ocidentais, democráticas e asseadas. Por muito inocente, folclórico e exclusivamente gastronómico que seja o jantar na Assembleia da República oferecido ao presidente do FC Porto, num momento em que há um processo a correr - mesmo sabendo todos, como suspeitamos, que vai prescrever e ser arquivado - estamos perante um caso lamentável de mais do que aparente pressão do poder político sobre o poder judicial. Democratas, ocidentais, asseados... depois queixem-se.
Na próxima quinta-feira, nesta página, prometo aos leitores uma reportagem detalhada ao pormenor do jantar oferecido pela Assembleia da República ao presidente do FC Porto. Foram instalados vários microfones nos cestinhos de pão e poderemos, assim, todos desfrutar dos diálogos, graças e trocas de confidências entre os convivas.
Se tiver paciência, vou traduzir para italiano as transcrições das gravações. A ver se a coisa fica mais divertida.
Leonor Pinhão (que ainda vai ter de pagar impostos)
nota: Ficamos então a aguardar as conversas telefónicas captadas pelos cestinhos do pão ... em italiano ou em português!
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